A menos de três dias da data marcada para a apresentação em Garanhuns
da peça"O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu", uma guerra jurídica
está sendo travada entre o Ministério Público, através da combativa 2ª
Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania, que tem à frente o não
menos combativo promotor Domingos Sávio Pereira Agra, e a
Justiça, representada, neste caso, pela Vara da Fazenda Pública, que está
sendo interinamente chefiada pelo juiz Eneas Oliveira da Rocha.
O cerne da questão nessa disputa de argumentos, que será decidida pelo
TJPE, não é mais saber se a referida peça vem pra Garanhuns ou não, já que,
pelo que tudo indica, o espetáculo se apresenta na cidade de maneira autônoma
no próximo dia 27 em local ainda a ser confirmado. A controvérsia que opôs o
ponto de vista do promotor e do juiz, cada um ancorado na legislação que
julgam aplicável ao caso, é saber se perante o nosso ordenamento jurídico, que
tem como carro chefe a Constituição, houve censura e discriminação por parte
do Estado de Pernambuco e do município de Garanhuns quando o espetáculo
foi retirado da grade oficial do Festival de Inverno de Garanhuns. Na peça um
Jesus trans vivendo nos dias atuais é retratado pela atriz Renata Carvalho.
Depois de ter uma recomendação para que a peça fosse reinserida na
programação oficial do FIG rejeitada, a 2ª promotoria ajuizou uma ação civil
pública seguida de pedido de tutela antecipada contra o município e o
estado alegando que o cancelamento foi discriminatório e preconceituoso.
O pedido de liminar era pra que a peça fosse reincluída no FIG. Ao julgar
apenas a tutela, e não o mérito, o juiz Eneas Oliveira indeferiu a
liminar e argumentou que o estado tem discricionariedade para incluir ou
retirar apresentações artísticas em eventos como o FIG. Ele também escreveu
em sua decisão que não houve censura do município e estado na questão.
Com o não deferimento da liminar, o MPPE recorreu ao TJPE através de
um Agravo de Instrumento número 0008547-20.2018.8.17.9000 distribuído
para a segunda turma da Primeira Câmara Regional de Caruaru. No recurso,
o promotor de Justiça Domingos Sávio aponta que houve extrapolação do limite
da discricionariedade do Estado no cancelamento do espetáculo, destacando a necessidade de, no julgamento do mérito, aprofundar o exame da relação
entre princípios do sentimento religioso, da liberdade de expressão e
da discricionariedade da administração pública.
Domingos Sávio |
Em sua argumentação, o MPPE indaga, entre outras coisas, Em que uma peça que invoca ficticiamente – e até prova em contrário de forma respeitosa - a figura de Jesus Cristo para tratar da discriminação e da exclusão dos transexuais, significa desrespeito ao “sentimento religioso da comunidade”? Em outro trecho do agravo diz o MPPE:
"Aplicando tais lições ao caso concreto, verifica-se que não há justiça na exclusão de uma apresentação que, até prova em contrário,
foi prévia e regularmente selecionada pela curadoria responsável por
aprovar a programação do FIG 2018, quando essa exclusão dá-se em face
de manifestações contrárias, ainda que compreensíveis, mas não
assimiláveis pelo estado democrático de direito na medida em que
exigem a retirada da peça, dada a manifesta intolerância de tal
exigência, aliás, intolerância reconhecida pelo próprio Estado na
resposta escrita da Secretaria de Cultura à recomendação do
Ministério Público (documento em anexo). Ora, se o próprio
Estado de Pernambuco reconhece a intolerância das manifestações
contrárias que visaram a impedir a apresentação, não existe, no caso,
espaço para a discricionariedade administrativa."
Enéas Oliveira da Rocha |
Por fim, o MPPE requereu a concessão da tutela provisória de urgência satisfativa para que seja determinado ao Estado de Pernambuco que reinclua, em 24 horas a peça na grade de programação do FIG 2018.
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